Em março deste ano, o álbum “Clube da Esquina”, de Milton Nascimento e Lô Borges, considerado um dos mais icônicos da história da música brasileira, completa 50 anos de lançamento. Junto com o aniversário, também ressurge a polêmica sobre o processo movido pelas duas “crianças” que aparecem na capa. De acordo com a advogada Yasmin Condé Arrighi, especialista em direitos autorais, a ação pode acarretar no impedimento da reprodução da capa.
Ao contrário do que muitos acreditam, as crianças que aparecem em destaque não são Milton e Lô, mas sim José Antônio Rimes e Antônio Carlos Rosa de Oliveira, que eram crianças em 1972. Em 2012, ocasião em que se completaram 40 anos do lançamento do “Clube”, eles processaram os músicos, além da gravadora EMI e da Editora Abril, responsável pela foto. Os autores afirmam terem tomado conhecimento do uso da imagem apenas meses antes de ingressarem com a ação.
“É possível, sim, que o judiciário entenda pela abstenção de utilização da imagem dos autores do caso, porque devemos elucidar que o prazo prescricional é interrompido à data da propositura da ação, além disso, a contagem da prescrição se iniciará a partir do momento em que o titular do direito violado tem conhecimento do fato. De acordo com o processo, os autores tiveram conhecimento da utilização indevida da imagem meses antes da entrada da ação. Neste caso, o juiz poderá entender pela validade da demanda judicial e julgar pela retirada de todos exemplares que estão sendo vendidos, bem como, condenar ao pagamento pela utilização indevida em cima das vendas realizadas do disco desde então”, explica a advogada.
No entanto, a advogada afirma que a tendência é Milton e Lô serem isentados de responsabilidade caso a ação seja julgada como procedente. Isto porque a negociação com o fotógrafo era feita pela gravadora e pela editora, responsável por produzir a capa.
“Sem dúvidas o álbum discutido é um dos mais famosos e icônicos de Milton Nascimento e da música popular brasileira e ao completar 50 anos do lançamento do EP ‘Clube da Esquina’ um dos principais nomes da MPB será recordado não só pela lembrança do álbum que foi sucesso, mas também a questão judicial sem dúvidas será retomada novamente mais fortemente. Contudo, a escolha da capa e negociação com o fotógrafo, ainda mais naquela época, ficava a cargo da gravadora e da Editora Abril, isso poderá desvincular gradativamente a responsabilidade direta dos artistas, tirando o foco processual deles e deixando-os com o belíssimo legado da música brasileira”, acrescentou Yasmin.
Fundamento da ação
A especialista pontua que, segundo a legislação brasileira de direitos autorais, o direito de imagem é um dos direitos personalíssimos, ou seja, aquele que é intrínseco a cada indivíduo e a sua violação causa a quem comete dano, o dever de reparar. A Constituição Federal também prevê direitos e garantias constitucionais no Art 5. Dessa forma, é importante evidenciar que o direito de imagem é respaldado, sendo irrenunciáveis e intransmissíveis.
Dessa forma, a violação ocorre no momento em que se utiliza uma imagem sem a autorização expressa dos autores. Ou seja, o fotógrafo da imagem detém direitos autorais morais sobre a fotografia realizada naquele momento, naquela cena, porém, a pessoa fotografada detém direitos sobre sua imagem individual. O que deve ficar claro é que uma vez que o consentimento em ser fotografado ocorre, não necessariamente inclui a publicação da imagem devendo a liberação de utilização ser expressa e por escrito.
A especialista conclui recordando que a utilização de qualquer imagem para fins de publicidade comercial, e/ou passíveis de obtenção de lucro, que se enquadra no caso narrado, sem o consentimento da pessoa, implica em enriquecimento ilícito à custa de terceiro, que tem por consequência a devida reparação/indenização.
História da foto
A fotografia foi produzida por Carlos Filho, mais conhecido como Cafi. Ele faleceu em 1º de janeiro de 2019 em decorrência de um infarto. O artista tem em seu portfólio cerca de 300 capas de discos produzidas. A foto da capa do “Clube” foi tirada em 1971 em Nova Friburgo, na Região Serrana do Rio de Janeiro, onde viviam José Antônio e Antônio Carlos.
Fonte: www.atribunarj.com.br